Opinião ▪ The Favourite | Yorgos Lanthimos. 2018
Em 1708, a Grã-Bretanha está em guerra com França. A excêntrica Rainha Anne (Olivia Colman) governa, atormentada por problemas de saúde. É indiferente à política, economia, diplomacia do seu reino e é propensa a acessos de birra. A pessoa mais próxima de si, a sua conselheira e na verdade, a verdadeira monarca é Sarah Churchill, a duquesa de Marlborough (Rachel Weisz) mas quando a prima deposta desta, Abigail Hill (Emma Stone) chega à corte - na desesperada procura de asilo e de emprego - tudo muda, quer no pais quer no enredo palaciano. Estas três mulheres são as personagens principais de The Favorite - as mais intensas, ricas e complexas interpretações no Cinema em 2018 – e por isso a nomeação das três aos Oscars é mais do que merecida e justificável.
A Rainha além de doente (gota) está em luto permanente pela morte de 17 filhos. É uma mulher pouco adulta, com ataques de birras infantis, investidas selvagens de raiva injustificada e muito pouco competente no que diz respeito à governação do pais. É uma espécie de criança poderosa sem noção da “bomba” que tem em mãos. A sua melhor amiga e consorte de maior confiança - Lady Sarah, a duquesa de Marlborough, manipula impiedosamente a Rainha entre as quatro paredes do seu quarto. Mima e ralha com a monarca como se fosse uma criança. É esta a poderosa mulher que insiste na manutenção da guerra com França. Abigail Hill (Stone), que em tempos teve um título, é hábil e engenhosa e depressa aprende a sobreviver na corte, acabando por perceber que além da atenção da Rainha e do poder que isso acarreta, pode voltar a ter um nome e riqueza.
Sarah de Weisz é fria e honestamente bruta, um sinal aparente de genuína devoção à rainha. Enquanto que a Abigail de Stone, com o seu sorriso caloroso e comportamento espirituoso, é tão ou mais astuta do que Sarah e, sem dúvida, é mais calculista e arrojada.
É assim, entre os cenários arrematadores e figurinos extraordinários, que as personagens de Rachel Weisz e Emma Stone se movimentam e se desdobram em jogos de bastidores para disputar o papel de “favorita” da Rainha.
A fotografia do filme é magnífica, ainda mais se tivermos em conta que o realizador Yorgos Lanthimos usou apenas a luz natural. Quando as cenas decorrem de noite, os gigantescos e imponentes corredores do palácio são filmados com se se tratassem de cavernas escuras sendo apenas iluminados por velas. Os cenários captam a ideia de que sob a opulência barroca da realeza, a escuridão, a doença, a inveja e até mesmo a promiscuidade da corte empestam o ar com mais do que aroma de doença, com podridão humana.
O que dizer àqueles planos em que câmaras são colocadas em pontos estratégicos dos espaços e nos mostram as imagens como se se tratassem de um filme capturado por um aparelho de vídeo vigilância… São soberbos e dão ao espectador uma espécie de perspectiva voyeur.
O único ponto negativo é o facto de não termos tido o prazer de ver mais e de forma mais intensa Nicholas Hoult como o inteligente, manipulativo e cruel (Ministro) Harley.
O trabalho de Lanthimos não deve ser analisado com recursos à lupa da História enquanto ciência. Não pretende ser um "documento" histórico, é uma sátira aos rituais e excessos pomposos da monarquia britânica. É um drama perversamente divertido, minuciosamente vestido, primorosamente decorado e sobretudo, soberbamente representado.
Oh it is fun to be queen sometimes!
Título nacional: A Favorita
Data de estreia (Portugal): 07.02.2019
Trailer: